ELEFANTES 2015 - Sobre a Terra e Sobre o Mar

Texto: Paulo Mata
Artigo publicado na revista Sirius de Fevereiro de 2016



À parte o lema oficial dos “Elefantes”, poucos poderiam ficar-lhe tão bem, como o verso do hino nacional, que a foto que encabeça este artigo tão bem ilustra. Na verdade, também nisso o emblema da Esquadra 502 é representativo, quando mostra o paquiderme metade sobre a terra e outra metade sobre o mar. Porque é mesmo disso que constam as missões dos homens que voam os C295M na Força Aérea Portuguesa. E 2015 foi um ano exemplar.
Com raízes anteriores à própria Força Aérea, os “Elefantes” são uma das esquadras de voo com mais tradição e história a ostentar a Cruz de Cristo. E os C295M que operam são os sucessores de uma linhagem, que inclui os famosos Junkers Ju-52,Noratlas e os antecessores directos C-212 Aviocar.
Incorporados em 2009, os C295M atingiram já a bonita marca de 20 000 horas de voo durante sete anos de actividade. Pode por isso dizer-se que a Esq. 502 atingiu já a “velocidade de cruzeiro” na operação do modelo, que aportou novas e importantes valências, entre as quais a flexibilidade de realizar diversos tipos de missão, como iremos ver no decurso das próximas linhas. O ano de 2015 foi, pode dizer-se, um ano emblemático na demonstração dessa flexibilidade e capacidades aumentadas para a Força Aérea e para os serviços que esta realiza a nível nacional e internacional.


Destacamento no Mali – Operação Minusma

Em rigor, o ano de 2015 da Esq. 502 começou a ser preparado nos últimos meses de 2014, quando foi solicitada a sua participação na Operação Minusma, no Mali. No seguimento do destacamento da Esquadra 501, que operou com o C-130 naquele país do Norte de África durante o segundo semestre de 2014, as Nações Unidas manifestaram a intenção de continuar com a participação portuguesa até Maio de 2015. De modo a dividir o esforço da operação, caberia à 502 o primeiro destacamento de 2015.
Em Novembro e Dezembro de 2014 foi consolidada a preparação dos tripulantes e preparados os kits logísticos necessários para enfrentar um largo espectro de missões e assumir o desafio de operar num novo e exigente teatro de operações. Esta preparação passou, numa primeira fase, pelo treino através de um conjunto de voos em ambiente diurno e nocturno, no âmbito do transporte aéreo táctico, incluindo depois uma site survey ao Mali, para aquilatar as condições que iriam ser encontradas no local. A Esquadra fez deslocar também meios à Ala 35 da Força Aérea Espanhola, em Madrid, por esta possuir já experiência de operação do C295 no Norte de África, e para poder treinar em pista de terra em Saragoça, antecipando assim com maior rigor as dificuldades que poderiam vir a ser encontradas. Entre outros detalhes, foram definidas através desta colaboração, as zonas da fuselagem a proteger da projecção de pedras a partir do trem de aterragem da frente, para a operação em pistas de terra.
O treino das tripulações incidiu especialmente nas operações com óculos de visão nocturna (NVGs), uma vez que as operações diurnas não diferiam em muito das actividades normais da Esquadra. Através da site survey foi possível ainda avaliar as condições no aeroporto em Bamaco (capital), de onde o destacamento iria operar, bem como ter um primeiro contacto com o dispositivo e infraestruturas das Nações Unidas.



A acompanhar o contingente nacional, seguiriam ainda elementos da Unidade de Protecção de Força da Polícia Aérea, com o objectivo de garantir, durante as missões, a segurança em terra da aeronave, dos tripulantes e passageiros, devido ao ambiente hostil existente nalguns dos aeródromos onde iriam operar. Para segurança no ar, o C295M seria equipado com chaffs e flares para contra-medidas de ameaças guiadas por radar ou manpads (mísseis portáteis guiados por calor).

Lançamento de flares de protecção contra mísseis guiados por infravermelhos
Durante os meses de Janeiro e Fevereiro em que decorreu o destacamento, os Elefantes lograram assim executar 100% das missões atribuídas, que consistiram maioritariamente de transporte aéreo de passageiros e carga entre Bamaco e Gao para Tombuctu, Kidal  ou Tessalite.
Da aeronave pode dizer-se que teve uma prestação excelente, muito devido à preparação prévia e à manutenção preventiva realizada localmente.
“Teste de fogo” ultrapassado por isso com nota máxima, para Esquadra e aeronave.



EATT 2015

Não sendo uma novidade absoluta, uma vez que a Esq. 502 havia já participado com observadores no EAATTC (curso táctico avançado para esquadras de transporte da Agência Europeia de Defesa) em 2014 e no EATT em 2013 e 2014, foi a primeira participação plena no European Air Transport Training (EATT), destinado ao treino de interoperabilidade de frotas de transporte dentro da União Europeia.
Realizado em Junho na Base Aérea de Beja, e mal-grado as elevadas temperaturas que se fizeram sentir, a exigência tanto em termos tácticos, como de cenários e locais de operação, o exercício não representou dificuldades de maior, muito devido à então recente preparação para a Operação Minusma. Também em termos tácticos, as tripulações portuguesas estavam já muito bem preparadas, com base nos padrões de exigência estabelecidos em exercícios anteriores, como são o Real Thaw e o Hot Blade.

Largada de carga em para-quedas
As acções incluíram praticamente todo o espectro de operações que podem ser realizadas por uma esquadra de transporte aéreo e incluíram o transporte aéreo táctico, aterragens em pistas curtas e não pavimentadas, largada de carga e de pára-quedistas a baixa e grande altitude, formação táctica, aterragens de assalto diurno e nocturno com uso de NVG.

Aterragem em pista não preparada durante o EATT 2015
Os Elefantes assumiram por diversas vezes o papel de mission commander em missões COMAO (Combined Air Operations), o que inclui preparação, execução e debriefing complexos, tendo sido classificada pelos seus pares, como estando entre as melhores da Europa nesse aspecto.
Mais uma vez, todos os objectivos propostos foram atingidos, não tendo chegado aos 100% de missões cumpridas, apenas devido a um cancelamento por meteorologia.
O exercício permitiu o treino com tripulações estrangeiras, numa importante troca de conhecimentos e experiências, essenciais para uma evolução conjunta. Sublinhando ainda a importância de conseguir operar em conjunto, com aeronaves diferentes e forças de outros países, o facto deste tipo de treino ser válido tanto para operações em ambiente de guerra, como no apoio em situações de catástrofes naturais.

Um dos C295M de Vigilância Marítima da Esq.502. Visíveis os radares de busca (a preto por baixo) e lateral, além do FLIR sob o nariz da aeronave

Operações para a agência FRONTEX

Dando seguimento ao que vem sendo uma participação regular desde 2011, nas operações promovidas pela Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos Estados-Membros (FRONTEX), a Força Aérea empenhou a Esq. 502 em diversos locais do mediterrâneo e Dakar num total de  quatro meses e meio, divididos em quatro operações distintas. A novidade em 2015 prendeu-se com a operação pela primeira vez para os Elefantes, a partir de Dakar no Senegal, para fazer face à detecção de vectores de imigração ilegal entre a Mauritânia e as Canárias.

Embarcação com imigração ilegal detectada pelos C295M VIMAR da Esq.502 no Mediterrâneo

Tanto neste país africano (Op. Hera), como em Málaga – Espanha (Op. Indalo), Sigonela – Itália (Op. Triton) ou Kalamata-Grécia (Op. Poseidon), o objectivo passou pela detecção com o radar ou sistema electro-óptico (FLIR), de embarcações com imigrantes ilegais, com vista a serem posteriormente apoiados por embarcações de salvamento, para serem recolhidos, recepção de apoio médico e identificação pelos serviços de controlo de fronteiras.
As áreas e a quantidade de embarcações vigiadas atingem números impressionantes em 400 horas de vigilância efectuadas, com mais de 12 600 embarcações identificadas, entre as quais quase 200 contactos de interesse.  De sublinhar ainda que, durante o destacamento no Senegal, a Esq. 502 acabaria por realizar acções de Busca e Salvamento (SAR), acorrendo a uma situação de emergência, o que demonstra a elevada capacidade por parte de tripulações e aeronave em se adaptarem a diferentes missões, em curto espaço de tempo.


C295M VIMAR em passagem pelo Bugio

E ainda…

A actividade da Esq. 502 não se esgotou contudo nas acções pormenorizadas em relevo, incluindo ainda participação no exercício internacional de SAR “Açor”, a partir das Lajes, que acabaria por transformar-se numa das maiores operações de Busca e Salvamento reais desse ano, para prestar apoio a vários naufrágios, em condições meteorológicas extremas.
De realçar também que, todas as actividades enumeradas foram realizadas a  par com as normais missões do dia-a-dia, a partir da base no Montijo e dos dois destacamentos permanentes (Porto Santo e Lajes), e que incluem por norma missões de evacuações médicas, busca e salvamento, transporte de órgãos, transporte de pessoas e carga, largada de pára-quedistas, vigilância e reconhecimento (de tráfego marítimo, poluição, controlo de pescas, actividades ilícitas, etc), além da necessária constante formação de pilotos e navegadores.

Os "Elefantes" no Salão Aeronáutico de Le Bourget, Paris, França

Por tudo isto, os Elefantes têm vindo a marcar presença nas mais importantes feiras internacionais de aviação, em representação da Airbus Defense & Space, como exemplo do sucesso da frota C295M.
É que em Portugal trabalha-se muito e bem.
É bom que se saiba disso.




0 Debriefing:

Enviar um comentário

ARTIGOS MAIS VISUALIZADOS

CRÉDITOS

Os textos publicados no Pássaro de Ferro são da autoria e responsabilidade dos seus autores/colaboradores, salvo indicação em contrário.
Só poderão ser usados mediante autorização expressa dos autores e/ou dos administradores.

 
Design by Free WordPress Themes | Bloggerized by Lasantha - Premium Blogger Themes | Laundry Detergent Coupons